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Uma entrevista com o arquiteto italiano Piero Lissoni

O famoso arquiteto e designer conversou com Casa.com.br em sua visita breve ao Brasil. 

Por Por Vanessa D'Amaro
Atualizado em 21 dez 2016, 00h52 - Publicado em 16 Maio 2012, 00h42

Piero Lissoni é um dos mais conhecidos arquitetos italianos. É só acompanhar qualquer cobertura do Salão do Móvel de Milão para conferir peças assinadas por ele na maior parte dos lançamentos das marcas italianas — ele já desenhou para Kartell, Living Divani, Matteograssi, Porro, Cappellini e Flos. Na última semana, Lissoni fez uma passagem relâmpago pelo Brasil. A convite da RIOS ICP, ele apresentou um projeto de uma casa de campo no condomínio de luxo, Quinta da Baronesa – que fica nos arredores de Bragança Paulista, interior de SP. No dia seguinte, conversou com estudantes e conheceu alguns projetos deles na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP – o estudante com o melhor projeto seria convidado para um estágio no escritório de Lissoni, o mesmo aconteceria com um estudante da PUC Rio.  Entre um compromisso e outro, Lissoni arranjou um espaço na agenda para conversar conosco. Num bate-papo sincero, ele deu a sua opinião sobre jovens arquitetos, contou o que acha importante na carreira de um designer e ainda apontou o que acha necessário para a criação de uma cultura de design no Brasil. Abaixo, você confere uma galeria de fotos com imagens de produtos do designer.

PieroLissoni

O que o senhor achou deste contato que teve com os jovens estudantes de arquitetura? Gostou dos projetos?

Os projetos são quase todos bons, mas em quase todos existe um erro fundamental de arquitetura. Em todo projeto (não importa se for grande ou pequeno) deve haver um pensamento único. Eu acho que o erro que é cometido em todas as universidades do mundo é pensar que o projeto é um conceito. Na realidade, isso não basta. As pessoas que se tornaram ótimos projetistas são as pessoas que conheceram perfeitamente todas as etapas do processo [de criação]. Se você projeta um edifício e não sabe como está embaixo; ou se você desenha uma cadeira e não sabe como fazer uma das pernas; ou ainda se você desenha um relógio e não sabe como um mecanismo gira… você não deve estar fazendo este trabalho!

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Mas como o senhor vê os jovens arquitetos hoje? O senhor acha que eles criam projetos inovadores ou que mereçam destaque?

Eu acho que a juventude é uma doença passageira, e não é nem uma doença mortal. Depois de ser jovem, você deve ser alguma outra coisa. Como acontece em todas as gerações, o jovem cresce. Estes jovens arquitetos ou designers farão o mesmo trabalho que as gerações antes deles fizeram. Eles entrarão no mundo como nós entramos.

O senhor se sente mais arquiteto ou designer?

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Eu me sinto mais arquiteto! Sou 100% arquiteto. Mas, na Itália, ser arquiteto é ser designer. Em Milão, o trabalho de arquiteto significa que você estará preparado para fazer várias outras coisas. A cultura anglo-saxã é que criou esta ideia de um arquiteto faz arquitetura; um designer desenha os ambientes internos ou, quem sabe, móveis; e, o engenheiro se preocupa com a estrutura. Em Milão, não é assim. 

Quando o senhor resolveu ser arquiteto?

Eu sempre quis ser arquiteto, desde pequeno. Eu já brincava de ser arquiteto. Acho que até hoje eu brinco da mesma maneira, mas antes as brincadeiras eram pequenas. Hoje as brincadeiras são maiores! Ainda me sinto como aquele menino.

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Como o senhor se inspira para criar os seus trabalhos?

A vida me inspira. Tudo que me circula me inspira: o transito, os ruídos, o silêncio, a arquitetura, o cinema, a música, a literatura, os jornais… É uma questão de cultura! A vida é inspiradora.

O senhor tem algum trabalho preferido?

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Não existe trabalho que eu goste mais ou que eu goste menos. Quando eu decido fazer um trabalho é porque eu quero fazê-lo. O bom de se fazer o seu próprio nome é que se pode escolher quais trabalhos fazer ou não. Uma coisa que eu posso dizer é que você vai morrer de fome se você se comprometer. Se você vende o seu trabalho (ou os seus ideais), não tem como voltar atrás. A beleza deste trabalho é que você deve ser um pouco livre.

O senhor trabalha para várias marcas italianas, mas ainda mantém uma identidade própria nas peças que levam a sua assinatura. Como o senhor faz para manter este DNA no seu trabalho?

É importante você saber quais trabalhos escolher. Esta é a questão. Por exemplo: por que eu, milanês, devo ser bom arquiteto e bom designer? Porque ser um bom designer me dá uma liberdade colossal de escolher ser um bom arquiteto. Em todo o mundo, para ser um bom arquiteto se deve trabalhar com liberdade, isto é, escolher os seus clientes. Às vezes, trabalhando somente como arquiteto você acaba não conseguindo fazer isso, e acaba vendendo a sua alma. Eu preferi ser um bom designer para, assim, poder ser um bom arquiteto.

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O senhor já participou da London Design Festival? Acha que eventos como este fora da Itália são importantes para chamar a atenção das pessoas para o design?

Como todo astro do rock, eu já fiz participações na London Design Festival (risos). Mas eu acho que é impossível falar de design se não existe uma indústria que faz design. O grande erro é se pensar que é suficiente inventar uma semana de design, uma escola de design, uma universidade de design… Se não existe background – e background quer dizer cultura de design, indústria – todo o resto não existe. Desenvolver uma indústria significa começar com uma cópia, eu entendo. Mas depois dali é necessário andar em outra direção. Falando do Brasil, os irmãos Campana, por exemplo, hoje são produzidos na Itália. Foi a indústria italiana quem os descobriu. O mesmo acontece com muitos designers bons de outros países, inclusive, aqueles que vêm de Londres. Eu acho que é possível que o Brasil possa vir a ter outros designers muito bons, mas para que isso aconteça é necessário ter uma indústria de pequenos produtores ou artesãos que se arrisquem a desenvolver a técnica de produção.

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