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As experimentações de Harry Allen, o designer do ano no BOOMSPDESIGN

Prestes a embarcar para o evento no Brasil, o designer americano falou ao Casa.com.br sobre o seu trabalho e seus planos para o futuro

Por Vanessa D'Amaro
Atualizado em 17 fev 2020, 15h56 - Publicado em 9 ago 2019, 11h36
(Divulgação/BoomSPDesign/Casa.com.br)

Eleito o designer no ano do BOOMSPDESIGN (que ocorrerá de 19 a 21 de agosto junto com o festival Design Weekend), o americano Harry Allen, nascido em Nova Jérsei, é conhecido internacionalmente pela série Reality, em que criou para a Areaware objetos extremamente realistas como um banco em formato de porquinho ou o gancho em formato de mãos.

A experimentação com materiais, técnicas e tecnologia é uma das marcas de seu trabalho – que hoje faz parte da acervo de vários museus nos EUA, incluindo o MoMA, em Nova York. A razão de tanto sucesso fica evidente na entrevista que concedeu, pouco antes de embarcar para o Brasil, ao Casa.com.br: como todo grande designer, Harry Allen tem uma capacidade única de se maravilhar com a vida e com o mundo. Confira abaixo a nossa conversa exclusiva e conheça alguns de seus projetos. 

Isso é um banquinho (Divulgação/Casa.com.br)

Você foi eleito o designer do ano pelo BOOMSPDESIGN. Como você se sente vendo o seu trabalho reconhecido no Brasil?

É uma honra ter sido escolhido como o designer do ano no BOOMSPDESIGN. O Brasil tem uma belíssima história de design, com impacto global. É um bom lugar para ser homenageado. 

Você já esteve no Brasil anteriormente? Você conhece o trabalho dos designers brasileiros ou acompanha alguma marca nacional?

Em 2010, estive no BOOM em São José do Rio Preto e em São Paulo. Aproveitei a oportunidade para viajar pelo país e, inclusive, tive o convite, na época, de trabalhar com a empresa de iluminação, a Vialight. Além disso, ao longo dos anos, fiz alguns amigos designers brasileiros, incluindo Fernando e Humberto Campana, Carol Gay e Bruno Jahara. Espero revê-los em São Paulo desta vez! 

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A sua série Reality for Areaware é muito conhecida pela comunidade brasileira de design. Você poderia compartilhar conosco seu processo criativo para esta série? Como você se sentiu ao moldar as suas próprias mãos?

Criar os produtos para a série Reality foi mais um trabalho de colecionar do que de projetar. Eu sinto dificuldade em lidar com algumas limitações tradicionais de design. A maior parte do que pode ser feito com forma e cor já foi feito. Assim, quando eu tive a ideia original para esses produtos, a Reality TV estava se tornando popular e, é claro, o mundo da música já estava na era do sample, então pensei, por que não usar isso para projetar peças de design? Por que não pegar emprestado esta fórmula existente em outras áreas?

Gancho no formato das mãos do designer (Divulgação/Casa.com.br)

Moldar a partir de escala real é uma técnica antiga no mundo da arte, mas representou uma nova estética para o design. Os produtos para Areaware são produzidos em resina, em moldes de silicone, que permitem detalhes surpreendentes. Os moldes masters também são feitos de silicone, então quando eu moldo minhas mãos eu sento por uma hora e meia com a mão em um barril de silicone líquido. Depois de um tempo, é difícil sentir em que posição está sua mão, e geralmente é preciso algumas tentativas para acertar o modelo certinho do gancho. Todos me perguntam por que eu não moldei mãos de outras pessoas – e eu até gosto da ideia de usar uma mão feminina ou de criança, e posso eventualmente fazê-lo – mas eu sou o único que tem paciência para isso. Além disso, eu eu gosto do fato de que eles são literalmente moldadas como as “mãos do designer”.  

Mãos, em tamanho real, que carregam flores (Divulgação)

Agora, porém, estou me distanciando um pouco dessa técnica. A digitalização em 3D percorreu um longo caminho desde que comecei este projeto e recentemente comecei a usá-la para criar formas. É um novo mundo para mim. Agora também estou evitando trabalhar com resina. Eu posso obter o mesmo efeito com argila e a impressão em 3D já evoluiu muito e está se tornando viável para alguns dos meus projetos também. Por exemplo, a Lâmpada Firefly (futuro lançamento) será um produto impresso em 3D. Acredito que meus produtos da Reality são tão bem sucedidos porque não exigem uma formação especial para entender. Todo mundo sabe como é um porco e meu banco se parece exatamente com um porco. Sua qualidade literal contribui para seu sucesso. É claro que o mundo da arte e do design recebe a mensagem conceitual, mas leigos de todos os tipos também podem se relacionar com o produto. 

Você era uma criança criativa? Quando percebeu que o design era o caminho certo para você? Você teve um momento específico ao longo da sua vida?

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Eu sempre fui uma criança criativa e meus pais me incentivaram muito quando eu era jovem. Minha mãe sempre diz que “me deu muito giz de cera” na minha infância. Eu era um grande ceramista no Ensino Médio, mas quando chegou a hora de escolher um curso universitário, foi difícil imaginar uma vida na cerâmica, então eu fui para a Universidade e estudei Ciência Política. Foi bom para mim. Quando me mudei para Nova York, depois da graduação, migrei de volta para as artes criativas e acabei no Pratt Institute.

Como você descreveria seu estilo e sua filosofia de design?

Esta é a pergunta mais difícil que você me fez! Eu sou um camaleão de design. Fui influenciado pelo modernismo e ainda acredito na filosofia “menos é mais”, mas minha carreira me levou para direções muito diversas. Quando olho para o meu trabalho, tenho dificuldade em encontrar um fio condutor. 

Quando eu comecei a trabalhar com os produtos da série Reality, eu tive dificuldade para contextualizá-los. Por fim, percebi que eles eram tão simples quanto qualquer um dos meus trabalhos – não simples em matéria de design, mas simples conceitualmente. Da mesma forma que alguém pode escolher uma pedra específica para cobrir um balcão, eu escolhi um formato em escala real para um produto. Eu me inspirei no mundo ao meu redor e fiz um trabalho mínimo com a forma. Então, de certa maneira, esses produtos são extremamente modernos.

Eu gostaria de ter um nome apelativo para definir o meu estilo, mas fico maravilhado com a beleza do mundo e tento trazer o máximo disso para o meu trabalho. A beleza pode ser um cálculo matemático pela qual uma forma é definida, um material, uma cor, mas também pode ser um conceito. A chave é encontrar o equilíbrio certo entre os elementos. Se for conceitualmente forte, mantenha a cor neutra. Se for um material complexo, mantenha a forma neutra. É claro que essas são escolhas pessoais, mas, como eu disse, sou um designer do tipo “menos é mais”.

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O que te inspira a criar?

Meu trabalho é uma extensão da minha vida. Ao crescer e experimentar coisas novas, o que me inspira muda. Além disso, estamos vivendo uma enorme transformando no mundo hoje. A revolução digital combinada com a crise ecológica vai definir o século 21, e todos nós devemos nos mobilizar com relação a isso.

Luminária Kila, Harry Allen para Ikea (Divulgação/Casa.com.br)

Quando comecei, fiquei fascinado com a promessa do século 20 de que o design poderia tornar a vida melhor para todos. Você pode ver esse otimismo nos meus primeiros projetos, como o meu mobiliário Living Systems e Moss. Projetos como a luminária Kila para a IKEA e a minha garrafa para Marc Jacobs também cumpriram o sonho de chegar de serem produzidas em massa. 

Neste momento, eu ando muito motivado pelo próprio processo de trabalho. No outono passado, eu aprendi novas técnicas de cerâmica, e isso me fez ter outras ideias com o material. Muitos dos meus novos produtos fazem o uso de tecnologias digitais – como digitalização 3D ou impressão 3D, e isso também é inspirador. O mundo digital forneceu todo um novo conjunto de ferramentas criativas e eu acredito que elas abrem novos caminhos para o design.

Se eu experimento a beleza em alguma coisa, tento identificá-la e incorporá-la ao meu trabalho. Alguns anos atrás, quando eu estava terminando de ler um livro maravilhoso, fiquei imaginando se seria possível aplicar belos pensamentos e ideias ao meu trabalho. Eu pedi a um amigo escritor para me ajudar, e fiz um exposição inteira baseada em texto. Nada está fora dos limites.

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Você vem fazendo experimentos com novos materiais em alguns de seus trabalhos recentes. Você poderia nos contar mais sobre isso?

A experimentação sempre fez parte do meu trabalho. Um dos meus primeiros sucessos veio quando minhas lâmpadas de espuma de cerâmica entraram na exposição do MoMA, “Materiais mutantes em design contemporâneo”.

Painel acústico feito de cogumelos, Harry Allen para Ecovative (Divulgação/Casa.com.br)

Meu interesse pelos materiais é uma extensão do meu fascínio pela realidade do mundo. Eu costumava procurar novos materiais, como a espuma de cerâmica, mas agora a minha melhor experimentação material acontece com os parceiros. Alguns anos atrás eu fiz uma parceria com a Ecovative, fabricante de um material feito de cogumelos – é tanto um material novo quanto uma nova técnica de fabricação, já que eles “criam” este material em moldes. Quando está seco, é muito parecido com a placa de papelão, com a diferença que o cogumelo tem característica corta fogo. O produto que projetei para o Ecovative é chamado de “Weave“, é um painel acústico. A Designtex forneceu um tecido reciclável para cobrir os painéis de modo que, no final de sua vida útil, “Weave” seja completamente biodegradável e possa ser usado para fertilizar o jardim. Projetos como esse me dão esperança para o futuro. Eu adoraria estar fazendo mais trabalho assim!

No momento, estou trabalhando em alguns objetos de vidro para um cliente e, embora seja um material comum, o vidro é incrível. Ela começa como areia, é aquecido para se tornar líquido e, em sua forma final, é transparente, frágil e incrivelmente útil. Todos os materiais têm uma beleza particular que nós, como designers, precisamos cultivar e explorar. Eu gostaria que os consumidores tentassem aprender mais sobre design também, porque sabendo o que eu sei sobre o vidro, cada gole em um copo de vidro é realmente mágico!

Seu trabalho faz parte do acervo permanentes de muitos museus importantes nos EUA. Como você se sente com esse reconhecimento?

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Ter trabalho em museus é a maior honra. É maravilhoso saber que meu trabalho será preservado e é inacreditável pensar que daqui a 100 anos alguém possa colocar meu trabalho em exposição e gerações futuras possam usá-lo para aprender mais sobre a virada do século XXI. É sentir-se um pouco imortal e isso é muito gratificante!

Quais são os seus planos para o próximo ano? Você poderia compartilhar suas próximas coleções / projetos?

Estou começando a produzir objetos e coleções por meio da minha própria marca. É claro que continuarei a trabalhar com empresas e marcas à medida que os projetos surgirem, mas tenho muitas ideias que eu mesmo quero divulgar no mundo.

Luminária Firefly, de Harry Allen (Divulgação/Casa.com.br)

Por exemplo, eu só fiz e vendi algumas das minhas luminárias Firefly quando as apresentei pela primeira vez em 2009. É uma pequena peça baseada em um vagalume real. Eu propus para várias empresas de produzir em massa, mas por uma razão ou outra nunca aconteceram. Minha instalação no BOOM me deu a oportunidade de revisitar este produto – para reprojetar e criar uma experiência divertida – e agora planejo reeditar este produto através da minha marca, chamada – pudera! – “REALITY”. A ideia é que alguns dos meus novos projetos sejam feitos e vendidos mais como arte, e outros produzidos em massa.

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