O melhor da terra
Para se impor no alto da montanha, esta casa de campo investiu num diálogo com o entorno e no respeito à tradição construtiva local
Por que esta casa é econômica: técnicas simples, implantação eficiente no terreno
Projeto: Francisco Fanucci

Quando decidiu erguer um cantinho na região serrana de São José dos Campos, SP, o paulista Francisco Fanucci se valeu do melhor de seu repertório: a soma da construção brasileira tradicional com a arquitetura contemporânea. No corpo a corpo da obra, enfrentou desafios impostos pelo orçamento e pela mão-de-obra disponíveis – os trabalhadores locais dominavam só as técnicas básicas de construção. Assim, ele adotou a simplicidade como meta do projeto. O primeiro passo foi respeitar a inclinação natural do terreno e desenhar um refúgio em L, acomodando-o na porção mais plana e estável dos 20 mil m² da área, dispensando grandes aterros e cortes. Elementos descomplicados, como o telhado de meia-água, e materiais baratos – caso dos blocos de concreto das paredes -, também foram adotados. Velhos conhecidos dos pedreiros da região, as paredes caiadas e o piso cimentado minimizaram as chances de erro e desperdício. “Eles realizaram com excelência as tarefas comuns. As inéditas eram experimentadas com animação até acertarem”, conta Fanucci. Exemplo disso foi a impermeabilização dos contrapisos, uma das novidades que lhes foram apresentadas durante os seis meses de empreitada.

Pontos de economia
Uma tora de madeira amendoim encalhada havia anos numa serraria – e em oferta – tinha a exata medida da sala (4,80 m de comprimento). O arquiteto arrematou a peça para colocá-la no piso da sala, na transversal, dispensando emendas e evitando perdas. Mandou cortá-la em pranchas de 2,3 cm de espessura, aparelhadas e retas – sem o encaixe macho-e-fêmea dos assoalhos. Depois, as tábuas foram pregadas sobre barrotes fixados no contrapiso e receberam cera como acabamento.
Para simplificar e baratear a alvenaria, as paredes levam blocos de concreto, cobertos de massa grossa e cal – a economia está em pular as etapas de reboco, emboço e massa fina. “Espalhamos a massa e alisamos com uma régua de madeira”, explica Fanucci. Para a caiação, ele adotou cal comum adicionada a fixador.
No lugar de lambris de madeira, que teriam de ser comprados em outro local (pagando-se o frete), usaram-se esteiras de bambu trançado. São uma especialidade da região e foram feitas por um artesão. O processo implica pregar o material nas terças da cobertura, deixando aparentes as vigas e tesouras do telhado (esconde a subcobertura aluminizada, que evita infiltrações). O friso de bambu arremata o encontro com as tesouras.
As duas faces do projeto
O refúgio se organiza em duas porções: a primeira resume-se à face que se volta para o amplo vale, barra o gélido vento sul e afirma sua presença no entorno. “A linha que define o muro da casa, que separa a face sul da norte, foi o primeiro traço do projeto”, diz o arquiteto, que acomodou sala, cozinha e churrasqueira nessa face. Do outro lado, onde estão os quartos, a casa sugere o convívio (fotos grandes) e é mais protegida pela paisagem. Abre-se em varandas para uma espécie de pátio e recebe o sol saudável da manhã. Também incorpora um pouco do jeito tradicional de construir naquelas bandas, como o telhado de meia-água e o cimentado colorido.
Pontos de economia
Os pilares roliços são antigos postes de luz, comprados de demolição. Como já vêm tratados contra a umidade, o arquiteto dispensou acabamentos protetores (do tipo verniz ou stain). Cada um deles se liga por pino metálico a uma base de pedra – extraídas do terreno, partidas na obra e assentadas no piso com argamassa. Essa providência é tradicional na arquitetura japonesa e garante que a água do solo não suba e estrague a madeira.
Nas varandas e na cozinha, o piso é artesanal. Primeiro, preparou-se uma base cimentada sem coloração. Quando a umidade natural do cimento (nata) brotou na superfície, a área sofreu a queima: uma mistura de cimento e de pigmento Pó Xadrez, da Lanxess, foi polvilhada e alisada com desempenadeira de aço. “Até hoje, não apareceu fissura.” O acabamento não guarda segredo: cera.
As esquadrias de angelim-pedra foram desenhadas por Fanucci e executadas pela Baraúna, empresa da qual é sócio. Do tipo balcão, têm as partes superior e inferior independentes, e saíram a preço de custo. Sua vantagem é dosar a entrada de luz e oferecer possibilidades de abertura. No acabamento, receberam impregnante do tipo stain (Polisten, da Sayerlack), que dispensa a lixa e evita reaplicações freqüentes.