Vovós conectadas conhecem um mundo de possibilidades na internet

Na frente de um computador, muitas pessoas da terceira idade sentem-se acuadas. Mas as que conseguem vencer o medo descobrem na máquina um mundo de possibilidades.

Por Texto Lucila Vigneron Villaça | Design Roberta Jordá | Fotos Marco Antonio
Atualizado em 16 fev 2024, 12h12 - Publicado em 26 fev 2013, 17h41
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O fim de novembro, nós aqui da redação fomos surpreendidos pela mensagem de uma leitora, enviada por e-mail. Aos 58 anos, a baiana Edilamar Sanches Conceição, estatística aposentada, nos dizia como estava encantada com o mundo das redes sociais, em especial com o Facebook. “Vi como me tem feito bem. Foi uma renovação em minha vida. Por isso, queria sugerir a vocêsuma reportagem sobre os idosos que aderiram aos benefícios dos 3 T: Tirar as mãos do Tricô e colocar no Teclado.” Não tivemos dúvida de colocar essa sugestão na pauta de BONS FLUIDOS. Apesar de ainda não fazer parte do grupo de maiores de 60 anos, Edilamar se encaixa no perfil dos brasileiros sêniores, que mesmo aposentados e com os filhos criados resistem a adentrar o mundo virtual.

Vida nova pela tela do celular

 

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Tudo começou com a edição de agosto do ano passado da revista BONS FLUIDOS – a primeira que a baiana Edilamar Conceição recebeu como assinante. Folheando as páginas, a matéria sobre a técnica ho’oponopono lhe chamou a atenção, e ela ficou instigada a colher mais informações na internet. Aí veio a mudança. “Não sabia nada de computadores, mas não queria mais depender das minhas filhas. Pedi minha conexão com a rede pela operadora de celular e acessei o mundo virtual via telefone mesmo. Fui navegando e, quando percebi, já tinha adentrado a madrugada”, conta. Abriu-se então um mundo vasto e transformador. “Eu adoro os temas de espiritualidade. No Facebook, já participo de diversos grupos sobre o assunto.” Ela, que está afastada do trabalho por problemas nos rins há mais de dez anos, sentiu que sua vida ganhou novo ânimo. “Um dia acordei e percebi que estava mudada. Sentia vontade de me informar, compartilhar. Também voltei a escrever poemas. Agora, vou surpreender minhas filhas com novidades: comprei um com-putador e me inscrevi num curso de informática”, completa.

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Jornalista virtual aos 68 anos

 

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“A internet é simplesmente o máximo!”, diz a procuradora do Estado aposentada Ana Maria Boucinhas, de São Paulo. A razão por trás da animação é o portal https://www.amantesdavida.com.br, fundado por Ana com mais duas amigas em junho de 2012. Mas, há não muito tempo, ela morria de medo do computador. “Sempre pensava que ia apertar alguma tecla errada. Porém enfrentei o ‘monstro’ e acabei descobrindo um delicioso parque de diversões”, conta. Foi, então, para levar outras pessoas a desbravar esse mundo que Ana montou o site. “Comecei escrevendo textos cômicos sobre os ‘envelhescentes’. Todo mundo elogiava. Encarei o desafio de produzir o site, que dá dicas para curtir a tal terceira idade. Desperdiçar o tempo amolando os filhos é coisa dos velhos do passado”, diz. O filho Mário Silvestri apoia: “Minha mãe resgatou sua curiosidade”.

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Do tablet para a galeria de arte

 

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Quando completou 69 anos, a dona de casa paulistana Golda Kocubej Soriano ganhou de seu filho Renato um iPad. Ela já tinha certa intimidade com computadores, mas aquele aparelhinho trazia novidades que pediam adaptação. E assim, explorando suas ferramentas aos poucos, ela descobriu que podia desenhar ali. “Relembrei os cursos de desenho e me senti impelida a produzir. Passei a enviar minhas criações para meus filhos e netos, por email. Eles mandavam sugestões e me incentivavam. Fiquei tão animada que decidi imprimir tudo em tecidos e promover intervenções”, conta Golda. As ideias viraram bordados, costuras e colagens sobre os desenhos. Nascia uma artista plástica. E, de repente, aos 70 anos, Golda se viu expondo numa galeria pela primeira vez. “Nessa altura da vida, poder iniciar novos caminhos e me expressar é uma sensação maravilhosa”, diz. Convidado a fazer a curadoria da exposição, na Galeria Arte Infinita, em São Paulo, o escultor Dan Fialdini descobriu no trabalho de Golda visões bem-humoradas das facetas do relacionamento humano. “É uma obra surpreendente, que revela fortes emoções”, Afirma Dan.

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“Apenas 34% dessas pessoas têm computador em casa, sendo que dessas somente 12% acessam a internet”, diz Marcello Guerra, diretor do instituto de pesquisas Somatório, que fez um levantamento sobre uso de computadores por brasileiros com mais de 60 anos. Esse receio, na opinião da psicóloga e professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Anita Liberalesso Neri reside numa defesa natural do ser humano: “Ninguém quer errar e parecer ridículo. E, quanto mais velha a pessoa, mais ela tende a evitar esse tipo de exposição”, diz. Além disso, a revolução tecnológica promoveu uma inversão de valores que deixou os idosos vulneráveis. “Num passado recente, os sêniores eram símbolos de sabedoria, como detentores doconhecimento. Agora que os jovens mostram tanta facilidade para lidar com os computadores, eles se sentem obsoletos”, completa Marcello Guerra. Mas basta dar o primeiro passo. Quem ultrapassa essa barreira – muitas vezes ajudado pelos familiares –, como as personagens desta reportagem, só tem a ganhar. “Os idosos usuários de internet passam a acreditar em sua capacidade, e isso aumenta a autoestima. Do ponto de vista cognitivo, há uma maior ativação das conexões nervosas e da memória, levando-os a se sentir mais estimulados. Em termos sociais, a troca de informações e o resgate de contatos faz com que se sintam parte de um grupo. Ou seja, é totalmente benéfico”, finaliza Anita.

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