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“O ensino de qualidade sempre dependerá do professor”, diz Eugênio Mussako

A tecnologia em sala de aula faz maravilhas, não mágica. Segundo o educador Eugênio Mussako, somente o professor será capaz de despertar no aluno o amor pelo conhecimento

Por Raphaela de C. Mello
Atualizado em 20 dez 2016, 22h34 - Publicado em 4 jun 2012, 17h26
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O professor Eugênio Mussak, de São Paulo, chegou a se formar em medicina, mas largou o estetoscópio para se dedicar à educação, escrever livros e ministrar palestras. Ele venera sua biblioteca doméstica com 5 mil títulos, o que não o impede de se maravilhar com seu iPad. Mussak pertence à geração baby boomer (pós-Segunda Guerra Mundial), mas se infiltrou, com sucesso, na geração Y (os nascidos em berço digital).

Caçador de novidades, sim, mas, acima de tudo, educador. “Professor é aquele que se limita a passar conteúdos. Já o educador trabalha com significados, estimula a curiosidade do aluno”, afirma. Em entrevista para revista Bons Fluidos, o autor de Motivação – Do Querer ao Fazer (Editora Papirus), entre outros títulos, explica por que os aparatos digitais, isoladamente, não são suficientes para incutir nos alunos o fascínio pelo conhecimento. E avisa: a corrida tecnológica não deve substituir o investimento pesado no desenvolvimento das pessoas.

A escola está muito distante da nova juventude?

 

No livro Memórias de Adriano (Edhasa), a francesa Marguerite Yourcenar conta a história desse imperador romano. Um dos capítulos aborda o conflito de gerações. Portanto, naquela época, o embate geracional já existia. E vai existir sempre. Uma geração difere da outra na maneira como percebe o mundo. Vivemos um período em que essas diferenças estão mais acentuadas. Os estudantes de hoje pertencem à chamada geração Y, formada por jovens que nasceram no mundo digital. Mas, a maioria dos professores ainda habita o mundo analógico.

Cabe ao professor correr atrás da tecnologia?

 

Você pode ser da geração baby boomer e ter uma cabeça equivalente à da geração Y. Vai da iniciativa de cada pessoa. Hoje, o mundo é digital e quem quiser competir tem de se adequar a essa realidade. Os professores que se interessam, se atualizam, levam demandas à direção da escola, são aqueles que usam com eficácia o projetor de slides, o retroprojetor, o giz. O educador deve batalhar pela evolução dos métodos de aprendizagem. E não é só isso. A educação é bastante ajudada pela tecnologia, mas esta é apenas um meio. Um acessório poderoso que pode facilitar e acelerar a dinâmica do ensino além de motivar o aluno. No entanto, há atributos analógicos que não podem ser desprezados, como os valores humanos: respeito, compaixão, tolerância. O papel da escola é transmitir esses valores em qualquer época. O que muda são os meios que ela utiliza para isso.

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Quanto tempo vai levar para as instituições de ensino conseguirem se modernizar?

 

Estamos num processo de evolução que vai ser mais rápido em alguns lugares do que em outros, dependendo da condição financeira. A escola particular tem mais agilidade e facilidade para se equipar do que a pública, mas isso não é uma verdade absoluta. O poder público tem mais capacidade de investimento do que a iniciativa privada. O problema é que esse dinheiro é mal aplicado. Não falta verba. Falta, sim, competência e vontade. Além disso, há o fator individual. No mundo da educação, há professores e educadores. Seres completamente distintos. O primeiro é aquele que se limita a transmitir conteúdos, enquanto o segundo trabalha com significados e estimula a curiosidade do aluno.

Alguns educadores afirmam que a demanda por múltiplas tarefas, típica do ambiente digital, prejudica a capacidade de aprofundamento. O que você pensa sobre isso?

 

Quando a calculadora surgiu, discutiu-se se ela deveria ou não ser usada em sala de aula. Alguns educadores temiam que o aluno não desenvolvesse o raciocínio lógico. Outros diziam que o mais importante não era fazer conta, mas saber que conta tinha de ser feita. A calculadora que se encarregasse dessa tarefa. A meu ver, os dois lados têm razão. Há momentos em que o aluno tem de trabalhar o raciocínio lógico fazendo conta. Passada essa fase, ele ganha velocidade ao usar a máquina. A discussão em torno dos novos aparatos no fundo é a mesma. Meus alunos de pós-graduação usam notebook ou iPad. Acho ótimo, pois é como se estivessem anotando suas reflexões num caderno. Sem falar no alcance do aparelho. Recentemente, numa aula, citei dez livros. No final, um aluno veio me dizer que havia baixado todas as obras. Mas há de se manter o respeito. Eu me incomodo se estou numa aula ou palestra e vejo alguém acessando o SmartPhone. Isso equivale a estar conversando com alguém. O problema não é usar o aparelho. E, sim, me desrespeitar na medida em que estou ali oferecendo algo para ele enquanto ele se distrai com outra coisa.

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Como mostrar o que é relevante no meio de tanta oferta?

 

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A geração Y desfruta um senso de coletividade que nenhuma outra experimentou. Porém, sua superficialidade é preocupante. Quando se tem acesso a uma grande quantidade de informações, acaba-se aceitando o que é ofertado, sem aprofundamento ou questionamento. Convencer esses jovens a parar e ler um livro é um desafio para os educadores. E a oferta de informações só vai se intensificar. Eis o paradoxo da civilização. Festejamos a liberdade, que significa poder escolher. Mas a escolha traz ansiedade na medida em que pressupõe a renúncia. Isso vale para todos os aspectos da vida. A educação deveria servir – e, em alguns casos, felizmente, serve – para ajudar as pessoas a fazer as escolhas. Discernir entre o dever e o poder. Posso fazer isso? Se posso, devo?

O Plano Nacional de Banda Larga tem a meta de levar a internet a 40 milhões de brasileiros até 2014, com planos a preços populares. O que dizer dessa empreitada quando muitos jovens se formam no ensino médio sem dominar as ferramentas elementares da leitura e da escrita?

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Antes de serem analfabetos digitais, milhares são do tipo funcional, porque não foram educados decentemente. Não adianta esse indivíduo ter acesso à tecnologia porque ele não vai saber usá-la nem vai se interessar por ela. Não podemos aceitar a exclusão digital, só que resolvê-la isoladamente não vai solucionar o problema. É preciso valorizar o professor, disponibilizar mais verba, focar a gestão da educação e zelar pela eficiência do sistema educacional. Vi no Paraná algumas escolas transformarem o entorno por serem reconhecidas pelos moradores como centros de referência. A diferença estava no diretor, que não pode ser apenas gerente e sim um líder que entende a escola como parcela importantíssima da sociedade.

As crianças e os jovens de menor poder aquisitivo ficarão ainda mais para trás do que estão atualmente?

 

Provavelmente esse fosso vai aumentar. Há escolas que já usam quadro eletrônico e filmes em 3D. Por outro lado, tudo vai depender de como esses recursos são usados. Um professor burocrático não vai saber tirar proveito dessas ferramentas. O fator humano ainda é preponderante. A vontade é mais importante que o conhecimento. O sujeito com conhecimento, mas sem vontade, não faz nada. A criatividade, a reivindicação, a mobilização e a liderança, ainda que compartilhada, continuarão sendo vitais. Não dá para esperar que o Ministério da Educação ou o reitor da universidade resolvam todos os problemas. No entanto, o governo está se mexendo. Há vida inteligente na educação pública.

Muita gente diz que o livro digital, uma realidade em muitas escolas particulares de primeiro escalão, substituirá o papel. Você concorda com isso?

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Temos de aprender a diferenciar dilema de impasse. O impasse pressupõe o “ou”. O dilema aceita o “e”. Tenho uma biblioteca em casa com 5 mil livros. Não abro mão deles. Entretanto, estou usando meu iPad com gosto. O livro é uma das maiores conquistas da humanidade. Nós não vamos descartá-lo. Acredito fortemente nisso tanto quanto acredito que o livro impresso não vai impedir o avanço da versão eletrônica. Este é somente um recurso extra.

O ensino a distância está dando certo?

 

A educação a distancia não vai substituir a presencial. Ela veio para agregar. Especialmente num país do tamanho do nosso. Mas, a tecnologia, repito, é apenas o veículo. Os princípios pedagógicos devem prevalecer nesse novo modelo. Há momentos em que a interatividade é fundamental. Em outros, cabe ao aluno estudar sozinho, na hora que quiser ou puder. Mas o sistema permanece o mesmo. O educador deve fornecer a informação e ajudar o aluno a construir o conhecimento. O elo afetivo continua sendo primordial e ele surge quando o mestre faz com que o aprendiz goste de determinado assunto. Isso tem a ver com a paixão que o profissional deposita em seu ofício. Meus professores prediletos foram aqueles que demonstraram amor pelo conhecimento que estavam disseminando.

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