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Conheça Luciana Chinaglia e o trabalho da ONG Banco de Alimentos

Fundadora da ONG Banco de Alimentos, Luciana Chinaglia Quintão acredita que pequenas atitudes, como evitar o desperdício de comida, ajudam a combater um dos grandes problemas sociais do planeta: a fome.

Por Texto Patricia Bernal | Direção de arte Camilla Frisoni Sola | Design Luciana Giammarino | Fotos Marcos Pacheco
Atualizado em 20 dez 2016, 18h43 - Publicado em 3 jul 2012, 20h28

Com um sorriso no rosto, ela observa caixas fartas de mangas, escarolas e cenouras ao seu redor. Em seus braços, repousavam dois ramos de salsinha. “Isso aqui não é uma maravilha? E pensar que todos esses alimentos vivos e robustos teriam como destino o lixo…”, fala ao receber a primeira doação do dia, que será encaminhada a alguma das instituições assistenciais que a ONG atende em São Paulo.

Como funciona a ONG

 

Mãe de três filhos, libriana perfeccionista e eterna justiceira, Luciana Chinaglia Quintão é fundadora e presidente da ONG Banco de Alimentos, em São Paulo. Essa organização é responsável pela distribuição de alimentos doados por supermercados, hortifrútis, agricultores e empresas alimentícias paulistas para matar a fome de mais de 22 mil crianças, adolescentes e adultos em situação de exclusão social. Embora seu trabalho hoje esteja mais ligado à administração, sempre que consegue uma brecha na tortuosa agenda, essa carioca de 49 anos acompanha de perto o dia a dia da organização. Sua equipe de rua é composta de seis homens (com três furgões) que saem diariamente para recolher sacos de frutas, verduras e legumes que estão bons para o consumo, mas não servem para a comercialização por estarem fora dos padrões estabelecidos pela legislação para a venda. Entram na lista alimentos de tamanhos diferentes, com deformações visuais, muito maduros, com prazo de validade prestes a vencer, entre outras circunstâncias.

 

Essas “sobras”, doadas à ONG, ajudam a complementar aproximadamente 260 mil refeições mensais de 51 entidades filantrópicas na capital paulista. “Uma alimentação saudável faz toda a diferença na formação física e psíquica de qualquer pessoa. Por isso, o alimento é nosso primeiro remédio e deveria ser um direito de todos”, afirma Luciana. Para ela, o prato vazio de muitas famílias brasileiras certamente é reflexo da pobreza. “Só come quem tem dinheiro. Quem não tem depende da ajuda de outros, como ONGs, escolas e programas de apoio alimentar”, explica. Esse tipo de assistência social, porém, resolve apenas parte do problema. A empresária lembra que, além da distribuição de renda desigual, outro entrave é o desperdício.

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No Brasil, segundo dados reunidos pela ONG, 64% da produção agrícola é desperdiçada ao longo da cadeia produtiva: 20% na colheita, 8% no transporte, 15% na indústria de processamento, 1% no varejo e 20% no processo culinário e na forma como o consumidor se alimenta. “São 39 milhões de quilos de alimentos jogados no lixo todos os dias, o que daria para alimentar 19 milhões de pessoas”, lamenta.

História de Luciana

 

Caçula de uma família de classe média alta, Luciana nasceu em Ipanema e cresceu em meio à bela paisagem da Gávea, zona sul do Rio de Janeiro. Mas essa natureza deslumbrante convivia com cenas de um tremendo descaso social e isso a incomodava muito. “Eu precisava entender os motivos da desigualdade. De um lado a fartura e de outro a escassez, como se fossem dois Brasis”, lembra ela. “Nos tempos da faculdade [ela é formada em economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)], entre 1980 e 1984, ninguém falava de índices de pobreza, distribuição de renda, nada que denunciasse o abismo social entre as classes.” Já formada, foi atrás dos números da fome e da miséria no Brasil e ficou profundamente tocada. Na época, com 22 anos e recém-formada, quis acreditar que o problema se devia à extensão territorial do país. “Com o tempo, vi que as coisas não acontecem porque os valores da sociedade estão deturpados e a política caminha na contramão das necessidades do povo”, critica.

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Apesar dessa visão crítica da realidade brasileira, Luciana não sabia por onde começar. Casou-se, morou fora do país, fez mestrado em administração e foi tocando a vida sem nunca perder de vista a questão da miséria.

 

Herdeiras de uma grande distribuidora de revistas, Luciana passou a se dedicar aos negócios da família em São Paulo. “Era um trabalho tão intenso e gostoso que acabei me apaixonando”, confessa. Mas o prazer dessa empreita jamais fez com que ela esquecesse os números da fome e o peso da injustiça social. Pelo contrário. Cada vez mais o problema

a incomodava. Para compreender melhor a situação, resolveu estudar antroposofia, filosofia desenvolvida no inicio do século 20 que visa o aperfeiçoamento espiritual e o autoconhecimento, sempre em integração com o Universo. “Acabei dando conta de que tudo está em nossas mãos. Me perguntei: ‘Vou ficar aqui pensando ou fazer algo?’”

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Tinha 36 anos quando começou sua caminhada. O primeiro passo foi criar, em 1998, a ONG Banco de Alimentos.  Vendeu sua parte dos negócios da família, o que lhe rendeu o capital necessário para viabilizar seu sonho. Montou um estúdio de filmagens e fotografias para garantir renda que a sustentasse enquanto tocava a ONG. Diante dessa reviravolta, não faltou quem a condenasse: “Louca!”, diziam as pessoas ao saberem do projeto.

Os parceiros

 

Aos poucos, foi conquistando parceiros. O primeiro, e talvez o mais importante, foi a Mesa São Paulo, iniciativa do Sesc São Paulo criada em 1994 para combater a fome por meio da chamada colheita urbana, que recolhe alimentos e doa a instituições carentes. Era exatamente o que ela queria fazer, e fez. Mas foi além. Era preciso conscientizar as pessoas sobre o uso integral dos alimentos, seja em casa, nas indústrias, seja nos comércios, evitando assim o desperdício.

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Para isso, começou a promover cursos e ações educativas nas instituições assistidas, em empresas e entidades interessadas, onde se ensinam, por exemplo, o aproveitamento total e a manipulação correta de alimentos, técnicas de higiene e nutrição, além de uma culinária sustentável. “Ensinamos a utilizar partes do alimento que, em nossa cultura, são consideradas restos, como cascas, talos, folhas e sementes”, explica. Em 2007, criou um projeto pedagógico para fomentar discussões sobre o tema dentro da sala de aula, tanto em escolas públicas quanto em particulares. “A escola se torna assim protagonista no combate à fome e ao desperdício entre a garotada que representa o presente e o futuro do planeta”, afirma.

 

Para manter um projeto desse porte, é preciso buscar doadores e patrocinadores, numa rotina que classifica de eterna batalha. Ela precisa de muito apoio para continuar a perseguir seu sonho. Há tempos, quer erguer um galpão para armazenar alimentos industrializados, renovar e ampliar a frota de furgões, transformar a sede da ONG em um centro educacional, além de ampliar o número de pessoas assistidas.

 

“Não é pedir demais, é?”, indaga a empresária. E lembra que qualquer um pode ajudar, mesmo com pequenas atitudes, como evitar o desperdício e se engajar em projetos sociais. “Enquanto formos omissos diante da fome e de tantos outros problemas que destroem os relacionamentos humanos e a natureza, estaremos sempre enxugando gelo. Sou cabeça dura e não desisto”, finaliza.

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Onde encontrar a ONG Banco de Alimentos

 

A ONG Banco de Alimentos fica em São Paulo e oferece aproximadamente 260 mil refeições por mês, o que equivale a 5 mil toneladas de comida por ano. Alimenta cerca de 22 mil pessoas de 51 instituições filantrópicas, como asilos, albergues, associações de adolescentes, casas de apoio, creches e hospitais. Em média, são arrecadadas 44 toneladas de alimentos por mês, vindos de supermercados, hortifrútis, indústrias alimentícias e agricultores do Cinturão Verde, na Grande São Paulo, parceiros nessa batalha. A garantia da qualidade dos alimentos doados é de responsabilidade de nutricionistas que compõem a equipe. Todo o trabalho é supervisionado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que define até mesmo as normas de transporte dos alimentos. Conheça a ONG no site: www.bancodealimentos.org.br

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