Casa-varanda se transforma em espécie de farol à noite
De dia, o refúgio à beira-mar vale como um enorme terraço; à noite, sobressai a área construída em cima, envelopada por um inusitado material translúcido
Por Marjory Basano (visual) e Joana L. Baracuhy (texto)
Atualizado em 9 set 2021, 12h52 - Publicado em 2 jun 2017, 14h55
O enorme rasgo horizontal fica na altura certa para que “pequenos e grandes”
avistem a linha do horizonte, sem expor quem está deitado na cama.
(Divulgação/Marco Antonio)
Continua após publicidade
A articulação de opostos complementares – claro e escuro, aberto e fechado, dia e noite, refrescante e acolhedor – norteou a elaboração da casa de veraneio em Florianópolis, segundo projeto encomendado pela família ao escritório Una Arquitetos.
“O cliente é meu amigo de muito tempo e, como já fizemos a morada dele em Joinville, iniciamos essa outra jornada com algumas respostas”, explica Fernando Viégas, integrante do escritório paulistano.
O enorme vão resulta num pé-direito duplo, que facilita a comunicação entre os pavimentos. De cima dá para conversar e ver quem está à mesa. (Divulgação/Marco Antonio)
O fato de o oftalmologista radicado em Santa Catarina com a mulher e as filhas procurar os antigos conhecidos com uma nova demanda – e um orçamento superenxuto, para ser seguido à risca – determinou a imperativa síntese.
“Vamos fazer dessa casa uma varanda?”, indagou o arquiteto, em busca de soluções pertinentes e econômicas. “Afinal, eles surfam, levam a vida com despojamento, não seria necessário muito mais ali”, explica.
Continua após a publicidade
A grande esquadria de metal e grapia tem rodízios embaixo e abre a churrasqueira quando necessário, resguardando os proprietários de vento e sol – só o forno à lenha fica fora desse compartimento. No extremo oposto da varanda, outra porta oculta a lavanderia. Repare como o trecho de alvenaria ganhou aspecto natural com pintura em tom terroso, repetido nos ladrilhos hidráulicos do piso. (Divulgação/Marco Antonio)
Sua sensibilidade para entender o jeitão dos clientes e as peculiaridades do local (um terreno de 390 metros quadrados, com vegetação de restinga, em frente à Praia Morro das Pedras), ditou outro fator de sucesso: a estrutura de madeira. O elemento racional é também econômico, capaz de propiciar uma obra rápida e com pouco desperdício, reduzindo ao mínimo o trecho de concreto e alvenaria.
“Fazia sentido eleger uma matéria-prima tradicional na região e confiar a execução a uma equipe especializada e competente de Joinville, a uma hora de carro de lá”, prossegue.
Continua após a publicidade
Vitais para diminuir a austeridade da estrutura, os pilares em V vão do piso do térreo ao teto do primeiro andar, efeito perceptível também de fora da casa. (Divulgação/Marco Antonio)
Para se certificar do resultado, os arquitetos desenvolveram o projeto estrutural com um engenheiro calculista versado no trato com o material. Cada detalhe foi rigorosamente esmiuçado até o arcabouço surgir leve, tocando ao mínimo o solo arenoso, finalizado depois com um alegre ladrilho hidráulico.
Assoalho e forro são de garapeira, assegurando uma atmosfera quentinha nas noites de frio. (Divulgação/Marco Antonio)
Continua após a publicidade
Quanto ao programa de necessidades, a lista de pedidos também seguiu a lógica do estritamente necessário. Nada de ambiente gourmet, lavabo, suítes e que tais. Para a família adepta de hábitos simples e saudáveis, o rol incluía depósito de pranchas, chuveirão e três quartos essenciais.
Como tudo indicava, a edificação se revelou da maior funcionalidade passados os quase 12 meses de serviço.
Caixilhos da mesma madeira e vidro delimitam os quartos, sem coincidir com as fachadas. A claridade da manhã, dosada por persianas internas, desperta a família surfista ao atravessar as venezianas industriais (Multvent) (Divulgação/Marco Antonio)
Continua após a publicidade
Sempre que chove, é possível entrar de carro sobre a base pavimentada para descarregar compras. Quando os donos vão embora, basta fechar a porta – e pronto.
Tanta engenhosidade e singeleza causou espanto no condomínio. Ainda mais à noite, ocasião em que o projeto iluminado assume um invejável protagonismo.
1/6 Quando a noite cai, basta fechar as portas – a da escada, sobretudo – para a família se recolher nos ambientes do andar de cima. Naturalmente, então, a situação se inverte: o brilho das lâmpadas passa a ser destaque do lado de fora, atenuado pelos brises de PVC translúcido. (Divulgação)
2/6 Para ocultar eventuais deformações dos painéis de PVC com requadro de alumínio (usados aqui de modo inédito em obra residencial), a fachada surgiu levemente oblíqua. Chamada pelo arquiteto de “o fresco” da casa, a piscina (em tom esverdeado) se soma ao mar na tarefa. (Divulgação/Marco Antonio)
3/6 O enorme vão resulta num pé-direito duplo, que facilita a comunicação entre os pavimentos. De cima dá para conversar e ver quem está à mesa. (Divulgação)
4/6 Sala de jantar, estar e cozinha se integram no andar superior, separados dos ambientes íntimos por um espaço vazado – com portas de correr que abrem em L na quina –, o qual ainda receberá uma rede elástica. (Divulgação)
5/6 Desenvolvida pelos arquitetos com o apoio do engenheiro calculista, a estrutura se sustenta em sapatas isoladas e num pequeno corpo de concreto e alvenaria erguido nos fundos da casa (onde se concentram as instalações hidráulicas). Esse elemento tem a função de contraventar (travar) a armação de garapeira obtida legalmente, cujas partes chegaram cortadas ao canteiro para a montagem – feita numa semana. Foram 15 toneladas de madeira, menos de 10% do peso do corpo de concreto. O visual também é delicado: a solução em V diminuiu pela metade o número de pilares necessários. No andar de cima, as paredes são de drywall. (Ilustração)
6/6 Aberta para a praia, a construção dá as costas para o sol forte do poente e para um sobrado vizinho. As venezianas, nas demais fachadas, asseguram farta ventilação por todos os lados (Ilustração)