Desejos concretos
Há algo de curioso no mercado imobiliário. Na orquestração dos novos projetos, o estilo de vida dos compradores rege o perfil de cada empreendimento

Só preço, localização e quantidade de dormitórios não vendem um imóvel nos dias de hoje. “Pesam mais as aspirações pessoais do comprador”, aponta Claudio Tavares de Alencar, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e especialista em planejamento estratégico de imóveis. Essa tônica vale para o mercado americano. A maior imobiliária de Nova York, a The Corcoran Group, adotou isso de maneira clara em sua última campanha publicitária: “Não mostramos fachadas, mas pessoas em cenas que sugerem seus estilos de vida”, conta o agente Alexandre Froes, que trabalha em Nova York. A influência de anseios pessoais no momento da compra leva construtoras a incluir nos projetos um aparato de facilidades afinadas com os desejos dos potenciais compradores. Esse movimento delineia novos nichos, dando pistas de um futuro com residências mais personalizadas. Enquanto algumas tipologias de empreendimento estão consolidadas, outras se formatam conforme novas demandas, caso dos imóveis sustentáveis. “Itens de respeito ao meio ambiente serão regra, e não um diferencial”, argumenta Paulo Lisboa, arquiteto e vice-presidente da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA). Até essa maturidade chegar, pioneiros como a construtora Setin aproveitam para ganhar mercado – e experiência. Os condomínios Mundo Apto, em cinco bairros paulistanos, foram projetados com sistema misto de aquecimento para os chuveiros (solar e a gás) e com reúso de água. “Encontrei apartamentos mais baratos, mas escolhi esse condomínio porque, além de respeitar meus princípios de vida, oferece estruturas de lazer”, diz a empresária Giovanna Rillo.
Lazer e assinatura
Na década de 1990, a tão sonhada moradia com lazer, os chamados condomínios-clube, começou a consolidar-se nas metrópoles. Hoje, o segmento que oferece atrações para todas as faixas etárias, é um dos mais explorados. “Em São Paulo, o trânsito complicado e a sensação de insegurança reforçam essa vertente do mercado”, aponta Luiz Rogélio Tolosa, diretor da construtora Company. Áreas para diversão já viraram pré-requisito. Edifícios como o Grand Art e o Entretons, em fase de comercialização pela Lopes, no Campo Belo, deixam muitos clubes para trás. Além de itens considerados básicos, como piscina, academia e playground, os projetos sofisticam a oferta de atrativos com quadra de tênis, cozinha gourmet e até spa com atendimento profissional. Além da adequação às aspirações do público, muitas vezes um empreendimento recorre ao know-how de grandes marcas e pessoas famosas para conquistar o consumidor. Isso ocorre com mais freqüência em terrenos distantes de áreas centrais. “Quando o endereço não é o dos sonhos, o condomínio tem que oferecer uma essência diferenciada”, explica Mauricio Eugenio, presidente da Eugenio, agência de propaganda especializada no mercado imobiliário. “Senão, tudo se resume a tijolo e concreto”, diz brincando. Dessa visão de mercado, surgem torres com academias organizadas e equipadas por empresas como a Reebok ou com cozinhas idealizadas por grandes chefs, como Alex Atala. Na contramão desses conceitos de morar, há quem prefira os prédios antigos, desde que assinados por arquitetos consagrados. É o caso da fisioterapeuta Vanessa Queiroz, que morou por cinco anos no Edifício Bretagne, em Higienópolis, projetado por Artacho Jurado na década de 1950. Ao comprar seu imóvel, fez questão de procurar um do mesmo autor. “Esperei oito meses até surgir um apartamento no Edifício Louvre, no centro da cidade”, conta Vanessa. “A ousadia das formas, das cores das fachadas e dos espaços comuns, característica pioneira na época, sempre me encantou.”
Outros sucessos de público
O segmento de luxo – expressivo nas dimensões e nas cifras – conquista cada vez mais espaço nas cidades. Famílias tradicionais têm trocado amplas casas por apartamentos com localização prestigiada e segurança reforçada. É um mercado que oferece imóveis com estruturas completas de automação, fachadas modernas e área útil a partir de 250 m2. “O custo é de R$ 7 mil o m2”, avalia Ana Virgínia Carnaúba, gerente da construtora Cipesa. Ícones dessa realidade são o Brazilian Art, no Itaim Bibi, com sua fachada de granito com imponente totem lateral, e o Araçari Cidade Jardim, que terá visual arrojado.
Nas áreas de lazer, ambos ofertam menos recursos. “Muitos moradores têm casas de veraneio e não fazem questão de muitas opções de lazer”, justifica Sérgio Vieira, vice-presidente da Coelho da Fonseca, empresa responsável pelas vendas do Araçari. Para
Luiz Paulo Pompéia, diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp), o empenho em atender a demanda por imóveis luxuosos fez surgir uma lacuna: “O ‘bom padrão’ está esquecido.” A esteticista Suzana Baruel lamenta: “Só encontro imóveis novos na região das Perdizes ou da Lapa, na faixa de 60 m2 e R$ 200 mil, contra os R$ 120 mil que posso pagar.” Para Sérgio Canton, gerente de pesquisa de mercado da Fernandez Mera, “com essa metragem e preço só se constrói em regiões mais afastadas, como Pirituba e Imirim”. Traduzindo: em áreas mais nobres, os apartamentos single de até 60 m2 – destinados a casais sem filhos, solteiros, terceira idade e o público GLS – custam muito mais. “É uma fatia que representa de 10 a 12% dos compradores”, quantifica Luiz Paulo. Por causa do pouco espaço, há outros atrativos. Áreas comuns com cozinhas gourmet e lounges com home theater funcionam para receber visitas. Um exemplo é o Vivere Campo Belo, com apartamentos de 47 m2, vendidos pela Fernandez Mera. A empresa também comercializa o Estilo Higienópolis, com área útil de até 56 m2. Neste caso, o que importa para os singles é o status da localização, a infra-estrutura e as facilidades de acesso do bairro.