Crescer na cidade: a metrópole precisa ser boa até para os bebês
A metrópole é um lugar maravilhoso: espaço vivo, vibrante, de encontros, de amigos. Resta a nós zelarmos para que ela seja boa para todos, inclusive para os bebês

Dez anos atrás, eu e minha namorada, Joana, compramos um apartamento térreo, de fundos, na Rua dos Pinheiros, uma via movimentada de São Paulo. Tudo a ver conosco. Como não tínhamos carro, não ligávamos para a ausência de garagem no prédio, e era muito prático morar perto de tantas rotas de ônibus, numa área plana, onde se chega a qualquer lugar de bicicleta. O bairro era popular, cheio de comércios tradicionais – nosso quarteirão contava com chaveiro, lavanderia, mecânico, sorveteria. Apê perfeito para um estilo de vida agitado, a cinco minutos de ônibus do cinema, a dez minutos de bike do trabalho, perto da balada, dos amigos, da cidade. Aí o tempo passou. Joana e eu nos casamos. O bairro foi mudando. O mecânico fechou e virou restaurante francês. O chaveiro deu lugar a um vegetariano chique, a sorveteria se tornou uma hamburgueria da moda, a lavanderia agora vende “comida contemporânea”. No ano passado, Joana ficou grávida. E eu pensei que chegara a hora de mudar. Talvez uma casa maior, num lugar menos movimentado, menos urbano. Com garagem, claro. Fomos pesquisar, e os preços estavam loucos – se, em 2003, nosso apartamento havia custado R$ 100 mil, hoje as casas que nos interessam não saem por menos de R$ 1 milhão. Num fim de semana, andando pelo bairro, resolvemos que não queríamos sair de lá. Acabamos adaptando o apezinho para a vida nova. O escritório virou quarto de bebê. Ajeitamos o jardim para criar um canto verde e tranquilo. Resolvemos que não é nenhum absurdo viver sem garagem – no dia a dia, continuamos usando ônibus e bicicleta, mas agora temos carro também e pagamos mensalidade num estacionamento a duas quadras de casa. Aurora, nossa filhota, já fez dois meses. Sim, a poluição e a barulheira às vezes nos incomodam. Mas a metrópole é um lugar maravilhoso: espaço vivo, vibrante, de encontros, de amigos. Acho que Aurora, como seus pais, gosta dela. E todo dia tentamos cumprir nossa parte para que a São Paulo se torne um lugar bom para todos – inclusive para seus bebês.
Denis Russo Burgierman é jornalista, ama são Paulo, mas não costuma ser correspondido. Durante os intervalos entre uma fralda e outra, ele dirige as revistas Superinteressante, Vida Simples e Bons Fluidos, da Editora Abril.