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Por que respeitar as crianças é tão importante

Crianças precisam de escuta sensível e delicadeza no trato. É tudo muito simples se for realmente sincero. Veja por que amá-las.

Por Texto: Kátia Stringueto | Fotos: David Lazar
Atualizado em 14 dez 2016, 12h39 - Publicado em 18 out 2013, 17h58

 

Os adultos dizem: ‘Cansa-nos ter de privar com crianças (…). Cansa-nos, porque precisamos descer ao seu nível de compreensão’. Descer, rebaixar-se, inclinar-se, ficar curvado. Mas, na verdade, não é isto o que nos cansa, e sim o fato de termos de elevarnos até alcançar o nível dos sentimentos delas. Elevar-nos, subir, ficar na ponta dos pés, estender a mão. Para não machucá-las.”

A ternura no tratamento à infância foi uma constante na trajetória do pediatra, educador, escritor e humanista Janusz Korczak. A introdução acima, escrita para seu livro Quando Eu Voltar a Ser Criança (Summus editorial) consegue, no entanto, ser ainda mais doce ao exprimir o cuidado gentil que um adulto precisa ter com a vida que começa. Há mais do que sensibilidade

pura nas suas ideias. Janusz talvez tenha sido o maior amigo das crianças, porque soube entrar na fantasia delas, compreender-lhes a alma e porque nunca as abandonou. Em 1942, mesmo podendo salvar sua vida, o judeu polonês preferiu permanecer com um grupo de 200 órfãos retirados do gueto de Varsóvia e encaminhados para o campo de concentração de Treblinka, onde foram executados pelos nazistas. “É uma história real. Esse homem ficou com as crianças até o fim – morreu com elas – e poucas pessoas fariam isso. Além disso, sua obra transborda humanidade. Pais, jovens, educadores e cidadãos em geral deveriam ler como uma lição para a vida”, frisa Cisele Ortiz, psicóloga e coordenadora adjunta do Instituto Avisa lá, de formação continuada de educadores. “O que nos torna humanos é essa capacidade de se importar com o outro. E cada criança que amamos é uma oportunidade de nos redimirmos das nossas falhas e criar um mundo melhor.”

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Esse respeito e carinho começam bem cedo. Há cerca de 60 anos, uma pediatra de Viena chamada Emmi Pikler defendeu que a criança é competente desde o nascimento. Colocava o bebê de barriga para cima num ambiente desafiador para ele próprio ir atrás dos seus interesses, como brinquedos e acessórios atrativos. Por outro lado, quando a educadora ia trocar ou alimentar a criança, estava 100% voltada para ela. Diferentemente de um trocador cheio de penduricalhos para chamar a atenção do bebê, não havia distração. O foco era o que estava acontecendo entre educador e criança. “A criança ficava tão satisfeita com a presença do educador naquele tempo de cuidado que depois, quando ia para o chão, permanecia segura. Por outro lado, no chão, ao alcançar um objeto que a atraia, ficava feliz da vida. A confiança vinha dela e da certeza de que, quando preciso, o adulto está lá para ajudá-la. Estão aí os pilares da famosa autoestima”, diz Cisele. Carinho também se expressa em momentos singelos, como ao limpar o nariz de um pequeno, ao se abaixar para ficar no nível dele ou ao dar uma bronca sem ser estúpido – você deve se lembrar como se sentia quando recebia atenção nessas horas.

Uma cultura que protege

Meninos e meninas agradecem ainda quando não jogamos o lixo na rua, não furamos a fila, não brigamos na frente deles e não os humilhamos em público. “Esses seres hipervulneráveis precisam de proteção, inclusive quando a publicidade se aproveita da falta de consciência deles para vender algo”, entende a psicóloga Laís Fontenelle, do Instituto Alana. “Por tudo isso, carecem de um cuidado maior, uma cultura de proteção. Uma rede de pessoas que olhem ao redor e se envolvam para evitar qualquer abuso”, diz Ana Maria Drummond, diretor executiva da Childhood Brasil. Só no país, segundo dados da organização, metade das crianças residem em casas cuja renda é até meio salário minimo, há 241 rotas de tráfico infantil e 1.820 pontos vulneráveis à exploração sexual.

E saber que elas são tão simples e precisam de tão pouco. “Amor, coerência nos acordos, tempo para brincar”, lembra Renata Meirelles, há mais de um ano viajando com o marido e os filhos produzindo o documentário Território de Brincar. “Crianças são caçadoras. Buscam o tempo todo uma sintonia com o universo adulto. Relacionar-se com elas é como tocar uma música,” aprendeu ela. Quem as escuta pode dizer que ouve estrelas. Ou conversa com Deus.

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