Aprenda a fazer a meditação zazen
Sente-se e entregue-se ao momento. Esse é o portal zen-budista.
“Você já se encontrou consigo mesmo na grande intimidade do silêncio?”. Terna, porém assertiva, a pergunta lançada por monja Coen ecoa entre os presentes do Templo Taikozan Tenzuizenji, sede da Comunidade Zen-Budista Zendo Brasil, localizada no bairro do Pacaembu, em São Paulo. Instalado numa casa cercada por jardins, ao lado de um estádio de futebol, que fica bem barulhento em dias de jogo, o núcleo foi fundado pela religiosa, ligada à tradição Sotoshu Zen-Budismo. A doutrina nasceu na China, mas foi levada para o Japão pelo Mestre Eihei Dogen (1200-1253). O compromisso dessa linhagem é perpetuar os ensinamentos de Xaquiamuni Buda, iluminado que viveu na Índia há cerca de 2600 anos e alcançou o despertar supremo praticando o zazen, alvo do interesse ali. “Se você quer aquietar a mente, veio ao lugar errado. Nossa ordem não é contemplativa”, avisa a missionária em uma de suas palestras. O zazen pode ser praticado por qualquer pessoa, a despeito da sua religião. Em minha primeira experiência nessa linha de meditação, tinha vaga ideia do que me esperava. Sabia apenas que sentaria de pernas cruzadas, voltada para uma parede e que permaneceria imóvel por alguns minutos. É isso. E muito mais. “Za” significa sentar-se; “zen”, estado meditativo profundo e sutil. “Zazen é estar consciente de si mesmo e da teia da vida na qual somos causas, condições e efeitos”, ensina Coen.
Sentada sobre uma almofada redonda própria para o exercício (chamada zafu), com as pernas em posição de lótus ou meia lótus (quando o pé direito fica sobre o joelho da perna esquerda e o pé esquerdo no chão), os joelhos apoiados no solo e a coluna ereta, numa postura firme e confortável, rememoro a orientação quanto ao trato dos pensamentos: “Eles chegarão e partirão. Ora calmos, ora agitados. Deixe-os seguirem. A mente não se esvaziará nunca. Você apenas irá tomar a posição do observador. E poderá escolher não se prender à atividade mental”. Aí me lembro da tríade do zen-budismo: observar, atuar e transmutar. “Que maravilha conhecer a mente e poder usá-la de forma adequada, compreendendo que as emoções são naturais. O que nós fazemos com o que sentimos é a grande questão”, sublinha a monja.
É o que procuro fazer, disposta a perseverar, apesar das tensões percebidas em diferentes partes do corpo, do desconforto gerado pela imobilidade, além da música alta lá fora e de um pernilongo dando rasantes na minha testa. “É importante resistir ao desejo de se mexer a fim de aliviar imediatamente o desconforto. Esse aprendizado, inclusive, nos acompanha na vida”, esclarece a monja Wahô, encarregada de orientar os novatos. Da capacidade de se manter como uma montanha ao desapego em relação a desejos, sentimentos e sensações que resolvem nos visitar na hora H – e logo passam, como tudo – até o cerimonial que norteia a prática no templo, tudo é oportunidade de viver o zen, ou seja, de se fazer consciente de cada gesto.
Não por acaso, pesquisas relacionam esse treino à redução de estresse, a melhoras no tratamento da síndrome do pânico e ao desenvolvimento de áreas cerebrais relacionadas com a compaixão e a amorosidade. “Hoje, me sinto mais sensível e perspicaz nas relações interpessoais”, conta o empresário Victor Amarante, de São Paulo, adepto há três meses. Já a paranaense Maisa Correia, aluna e voluntária da Comunidade Zen do Brasil, diz ter encontrado sua essência. “Sinto-me equilibrada e conectada. Aprecio a sutileza de tudo o que é… simplesmente sou”, sintetiza. Independentemente de qualquer barulho externo ou distração. O mais importante, segundo a monja Coen, é a prática pela prática. Sem grandes expectativas. Apenas mantendo-se atento, instante após instante.
Como fazer
– Escolha um local calmo, seja em casa, no trabalho seja ao ar livre, pela manhã, à tarde ou à noite. Você poderá sentar-se com as pernas cruzadas sobre o zafu (joelhos apoiados no chão) ou se ajoelhar e sentar com os ísquios apoiados num banquinho de baixa estatura. Também pode sentar na beirada de uma cadeira ou mesmo da cama, mantendo os joelhos ligeiramente abaixo dos quadris e os pés fncados no chão e alinhados aos ombros.
– Determine o tempo disponível – no começo, apenas cinco minutos – e programe um despertador de som ameno. Com a experiência, vá aumentando o período de meditação para até 40 minutos. Muitas vezes o cérebro fca tão treinado que nem é mais preciso um despertador.
– Com os olhos entreabertos e a visão numa inclinação de 45 graus (é importante não fechar os olhos para manter-se atento no momento presente), volte-se para uma parede livre de distrações. Mantenha a coluna ereta, os ombros para trás e o queixo para baixo, o que permite a abertura do diafragma e facilita a passagem do prana – a energia vital.
– Faça o mudra cósmico (as costas dos dedos da mão esquerda repousando sobre os dedos da mão direita e a ponta dos polegares se tocando suavemente; iniciantes podem usar o colo como apoio). Esse gesto reforça o estado de atenção. Após três respirações profundas, feche a boca e respire de forma natural pelas narinas. então, observe os movimentos da mente, sem controlálos. Deixe-os passar.