Reforma utilizou poucos materiais para atualizar casa dos anos 70
Sob a pureza das formas, esta casa surgiu assim, superatual. O que fez toda a diferença e mal se vê? o projeto conservou a memória do que havia ali
Uma certa dose de ilusão marca a história recente desta morada, epítome da arquitetura minimalista e inventiva praticada por Guilherme Torres – capaz de enganar inclusive esta reportagem, que custou a perceber tratar-se de uma reforma e não de uma obra feita do início. “Obter algo com aparência tão simples – como nesse caso – faz parte da boa arquitetura. Mas dá muito trabalho chegar até aí”, revela o paranaense radicado há tempos em São Paulo, enquanto mostra para ARQUITETURA & CONSTRUÇÃO pela primeira vez fotos anteriores à intervenção.
Só mesmo diante de tais imagens para dimensionar a profunda mudança operada na casa térrea, erguida nos anos 70 e dona de um sólido apelo romântico. Basta citar que papéis de parede, lambris, esquadrias branquinhas, telhas cerâmicas e muita topiaria davam o tom do que permanecia de pé no local. E tudo aparentemente muito bem conservado.
Diante desse contexto, o jovem proprietário convocou Guilherme e sua equipe – conhecidos pela veia contemporânea – vislumbrando uma jornada de porte moderado, suficiente para renovar o estilo dos 800 m² localizados em um trecho elevado da Zona Sul da capital paulista. Planos traçados, pedreiros a postos, a costumeira arqueologia do efetivamente edificado apontou problemas antes invisíveis. A rede elétrica precisaria ser refeita. A hidráulica carecia de atualização. Composto de amianto, o isolamento do forro começava a esfarelar, exigindo, talvez, outra cobertura. Surgia a oportunidade perfeita para o time de projeto, convidado a propor alterações mais robustas e impactantes, alçar voo.
Assim se deu nas definições que vieram logo a seguir e também depois, ao longo dos quase dois anos da empreitada, conduzida pelo mesmo escritório. A almejada transformação aconteceu e foi de certo modo radical, mas acumulou o mérito de manter a distribuição dos ambientes, o desenho dos telhados, o pátio interno – em outra linguagem, claro.
“Quando entrei na construção antiga, adorei o que vi. A energia era boa, a circulação inteligente, batia sol onde devia. Decidi manter uma memória disso tudo”, explica o arquiteto, elucidando como, apesar de tão distintos, os espaços e as volumetrias resultaram estranhamente familiares após a reforma.
E não parou por aí. Para equilibrar o orçamento, ele ainda associou acabamentos refinados a outros econômicos, visando um resultado impactante. É por isso que a residência hoje exibe superfícies forradas de madeira capazes de enganar os olhos, revestimentos escuros em paredes e pisos falseando a noção de profundidade, além de uma cobertura ajardinada a redesenhar o horizonte. “Efeitos ópticos promovem a sensação de conjunto e simplicidade”, sentencia Guilherme Torres, referindo-se outra vez aos truques e enganos pelos quais começamos esta narrativa.