Quando recomeçar vale a pena
Temos de decidir se oferecemos um voto de confiança ao que ficou para trás ou apostamos as fichas em novas histórias
Lúcia se abriu para um novo amor após o divórcio. Vera entrou na faculdade assim que as filhas adultas agarraram seus diplomas. Mara voltou a dirigir após uma temporada longe do volante. Tatiana reatou uma antiga amizade graças a uma conversa regada a lágrimas e abraços. Os nomes das personagens são fictícios, mas suas histórias, reais. Mas, afinal, o que colhemos quando recomeçamos uma história do zero?
“Ganhamos a possibilidade de resgatar um sonho significativo”, afirma Lidia Aratangy, terapeuta de casais e família, autora de O Anel que Tu me Deste (ed. Artemeios). Já a psicóloga Celina Figueiredo, especialista em psicologia do budismo, vê em cada nova investida um exercício libertador. “Quando damos uma segunda chance a alguém ou a uma situação, passamos a olhar o outro e a nós mesmas de forma diferente”, diz a estudiosa.
Essa lógica compreende a essência do budismo. “Os seguidores de Buda buscam a liberdade interna, ou seja, não deixam que a mente se prenda a padrões condicionados”, comenta Celina. Logo, mudar de ideia, redirecionar o ângulo de visão, desbravar horizontes inexplorados, enfim, começar a acreditar no potencial de regeneração da vida é uma forma de escrever nossa história com mais fluidez.
A hora do jogo
Persistir, se reinventar, se refazer e sonhar são habilidades que dominamos como nenhum outro ser na face da Terra. E é a esperança que nos mantém ali, soprando em nossos ouvidos que seremos vencedores. Mas, como qualquer jogador sensato, precisamos reconhecer o momento exato de abandonar o páreo. “Enquanto a pessoa enxergar possibilidades, deve insistir”, opina o filósofo e professor Mario Sergio Cortella, autor de Não Nascemos Prontos! Provocações Filosóficas (ed. Vozes).
A terapeuta Lidia Aratangy prefere traduzir ao pé da letra a expressão segunda chance. “Para ser de fato uma segunda cartada, ela precisa apresentar uma condição nova, porque, se for igualzinha à da última vez, vai dar no mesmo lugar”, alerta. Isso quer dizer que, se você decidiu voltar a estudar ou retomar um relacionamento, essa vontade deve vir acompanhada de uma disposição bem diferente daquela que a fez aposentar os livros ou se afastar do parceiro. “Do contrário, a desistência vai se repetir”, ela avisa.
Repetir o mesmo padrão de comportamento, além de cansativo, enfraquece a forma de nos posicionarmos no mundo. “Quando ficamos presos a uma ideia, nos enrijecemos e nossa energia é rapidamente consumida por esse estado mental”, esclarece Celina.