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Os saraus estão de volta. Como organizar um na sua casa

Encontros regados a poesia, literatura, música, performance e dança esparantaram a poeira do passado e se modernizaram

Por Texto Raphaela de Campos Mello | Design Luiz Silviano | Fotos Pedro Napolitano Prata (São Paulo), Felipe Varanda (Rio de Janeiro) e Daniel Mansur (Belo Horizonte)
Atualizado em 22 nov 2022, 11h03 - Publicado em 20 set 2012, 13h20

Abrir as portas de casa para saborear em grupo diferentes manifestações artísticas é um nobre gesto. Quem promove encontros desse tipo fomenta a troca cultural e afetiva; já os que participam da festa levam suas melhores energias e intenções. Todos se engrandecem. Preparar o ambiente com carinho só torna a atmosfera ainda mais propícia ao desfrute das artes. “Recomendo o uso de flores perfumadas, tais como lírios ou angélicas, além de velas e incensos. É importante o participante se sentir acolhido no espaço. Isso deixa o artista bem mais à vontade para a troca”, opina Leandro Medina. Comes e bebes são indispensáveis. “Alimentar as pessoas é algo sublime. Aliás, alimentar a alma das pessoas é o grande resultado – transformador – desses encontros”, acrescenta.

Como são os saraus modernos

E squeça a pompa e a circunstância. Os saraus contemporâneos estão mais para jeans e camiseta do que para fraque e cartola. O prazer de se reunir em torno da poesia, da literatura, da música e da dança, costume cultivado por aqui desde o período colonial, virou domínio público. Encontros tomam conta de bares, cafés, livrarias, centros culturais, residências e até quiosques de praia. “Durante muito tempo, a palavra sarau esteve relacionada à formalidade. Mas, nos últimos anos, o público passou a participar ativamente, criando e se apresentando em clima de confraternização“, afirma Frederico Barbosa, poeta e diretor da Casa das Rosas – Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura, em São Paulo.

A periferia paulistana, berço de dezenas de saraus, prova que o fenômeno é democrático. “Esses eventos estão transformando vidas ao trazer entretenimento com alta dose de protesto e informação”, aponta o escritor Alessandro Buzzo, criador do Sarau Suburbano, que acontece às terças na Livraria Suburbano Convicto do Bixiga, na capital paulista. Já a poeta brasiliense Marina Mara trocou poemas por sorrisos na Cúpula dos Povos na Rio+20 e fixou cartazes em banheiros públicos, projeto batizado de Sarau Sanitário. “A poesia é dos mais fortes mecanismos de lapidação humana”, defende. O resgate da cultura popular, outra importante bandeira, motivou a criação do Saravau, idealizado pelo músico e arte-educador Leandro Medina e por Regina Machado, pesquisadora de narrativas tradicionais e professora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. A celebração ocorre cinco vezes ao ano no Paço do Baobá, centro de pesquisa e criação artística inspirado na tradição oral. Ali, contadores de histórias, músicos, palhaços e dançarinos enaltecem as raízes brasileiras e dialogam com outras culturas. “Reunimos quem deseja se encantar com a beleza e a generosidade de tantos artistas”, diz Regina.

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Porque os saraus são tão gostosos

“A humanidade sempre se uniu para se expressar. Essa é uma necessidade inerente ao ser humano”, pondera Eduardo Tornaghi, professor de teatro em comunidades carentes, poeta e fundador do sarau Pelada Poética. Regras e formalidades ficam de fora do evento, que acontece toda quarta-feira no quiosque Estrela de Luz, na praia do Leme, no Rio de Janeiro. “Queremos difundir o prazer da expressão pela palavra escrita, lida ou falada”, conta ele. Por estar em local público, a atração congrega crianças, aposentados, gente que faz uma pausa na corrida, donas de casa, poetas renomados e amadores. Em Belo Horizonte, a configuração é outra. Todas as terças-feiras, desde 2005, o complexo cultural Palácio das Artes abre suas portas para poetas brasileiros e internacionais, nomes consagrados e desconhecidos do grande público. O objetivo é abarcar a variedade de escolas, estilos, temáticas e propostas artísticas que abastecem a seara poética dos dias atuais. “A literatura se alimenta de todas as artes e dialoga com todas elas. Por isso, contemplamos a poesia cantada, a performance, a videopoesia”, afirma o poeta Wilmar Silva, criador e curador do Encontro Internacional de Leitura, Vivência e Memória de Poesia Terças Poéticas. “Ao fomentar a diversidade e ocupar o espaço público, a poesia revela sua função social e política, não só artística”, enfatiza.

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